quarta-feira, 1 de agosto de 2007

Sobre MPB e indústria cultural

Nos muitos pequenos espaços livres de uma vida corrida de grande cidade, sou compositor.
Não faço isso pra viver.
Tive quatro canções gravadas em produções alternativas, sem fins lucrativos. Toco numa pequena capela da periferia de São Paulo, onde o povo canta muitas de minhas canções, sem saber de quem é a autoria.
Mas volta e meia penso sobre a canção e o que ela representa na vida das pessoas. Desde que comecei a compor, ainda adolescente, aprendi uma lição: a melhor canção é aquela que cria uma relação entre as pessoas. Canções que eu achava muito boas foram esquecidas (inclusive por mim); outras, de menor qualidade musical ou poética (na minha opinião), vingaram e se firmaram.
Calipso e outros “fenômenos” se firmaram porque conseguiram falar para seu público, expressar o que essas pessoas gostariam de ouvir (escreveu Exupèry que a arte é dispor o jardim como o outro gosta de ver). Foi assim com Renato Russo, um cantor que iniciou a carreira extremamente desafinado, que se tornou o porta-voz de sua geração. Contudo, é bom lembrar que Calipso já está na grande mídia hoje, embora continue (ou não) com seu esquema de distribuição alternativo (que é uma informação de que não disponho).
A “indústria cultural” se apropria desses fenômenos para ganhar com eles (se não pode vencê-los, junte-se a eles). Mas também para dominá-los.
Calipso e outros escrevem essas canções que o povo gosta de ouvir. Mas o povo gosta de ouvir, na maioria das vezes, o que está acostumado a ouvir (o que lhe é oferecido para ouvir). E O QUE LHE É OFERECIDO NOS MCS, NA FAMÍLIA, NA ESCOLA?
Ministro uma oficina de composição musical nas férias. Apesar de não “curtir” rap, trabalhei muito com um rapper ajudando-o a construir a canção dele, mas fazendo-o ver outros valores, oferecendo-lhe outras perspectivas melódicas e poéticas.
Na capela em que toco, ensaio com as crianças algumas canções e danças da cultura popular brasileira, como catira ou congada. Uma vez estava ensaiando com elas e uma adolescente me pediu pra ver um texto que eu trazia na mão (e não tinha mostrado pra eles ainda). Ela fez um comentário elogiando o texto (era Patativa do Assaré, quem diria).